ROCK IN RIO LISBOA 2014
Dia 25 de Maio
É a enchente do costume. Já ninguém esperava outro fenómeno deste tradicionalmente avolumado Rock in Rio, o festival que pousou em 2004 em Lisboa, ainda menino, mas já com pretensões de fazer da Bela Vista, em Chelas, o lugar mais conhecido da capital portuguesa durante o mês de Maio.
Atravessado o descampado deste subúrbio de música vinda das janelas, penetra-se a multidão: ainda não bateram as 19 horas e a organização já calcula a presença de cerca de 30 mil pessoas no recinto. Se víssemos slot machines ao longo da Rock Street, não estranharíamos. Centro comercial a céu aberto, a rua que atravessa esta terra cheira a Las Vegas. Nesta cidade do Rock, há também um gigantesco colchão insuflável, uma roda gigante, aulas de dança e brindes em jeito de parque de diversões, a fazer jus ao objectivo do festival.
{gallery}FotoReportagens/2014/RockInRio2014/Dia25Maio/Abertura{/gallery}
À boss e à portuguesa
Já depois de The Hound e Cais Sodré Funk Connection, é em acordes de hip-hop tuga que se abre o Palco Mundo. Boss AC, de calças vincadas, toma posse do microfone junto a Aurea, que agarra as curvas do corpo para incitar à dança. Apostam na cena – e na contracena – da cumplicidade. Recordamos clássicos como “Lena e “Princesa”; inglesamos com Busy for Me” e “Ok Alright”. Mas é já na recta final que o inevitável acontece: “Sexta-feira” volta a arrancar a simpatia e a garra do público, na ironia de que a culpa da crise é do povo, sedento de “brincadeira”. Para rematar, a dupla despede-se com uma cópia (opção artisticamente duvidosa, mas a marcar pontos no campo do entretenimento): o êxito “Happy”, de Pharrell Williams, esgota os trunfos e faz galgar as endorfinas de uma massa sedenta de hits.
{gallery}FotoReportagens/2014/RockInRio2014/Dia25Maio/BossAC_Aurea{/gallery}
Faith para Paloma
Diríamos, com segurança, que o melhor da actuação da britânica Paloma Faith é a imagem. A performance ganha no padrão xadrez que traz vestido – com boina à mistura –, mas ao fechar os olhos, pouco sobra de entusiasmante. Empenhada em mostrar, sobretudo, as canções do seu trabalho mais recente, A Perfect Contradiction, é mais uma entertainer a homenagear (ou a utilizar??) o sucesso de Pharrell Williams (com “Can’t Rely on You”) para pintar de vigor a sua prestação.
Mas, do público também se ouve a desculpa: “Queremos é o Robbie Williams!” Anteceder o cabeça-de-cartaz da noite não é para todos. Ainda assim, a cantora-actriz fez bem em manter-se descalça sobre o palco: segredo para uma actuação certa, sem falhas, e com os pilares soul a darem-lhe cordas (vocais) e um background envolvente.
{gallery}FotoReportagens/2014/RockInRio2014/Dia25Maio/PalomaFaith{/gallery}
O "rei" Robbie
Já passa das 22h quando o ex-Take That Robbie Williams sobe ao Palco Mundo para se fazer mostrar na sua fatiota meio Fred Astaire, meio Frank Sinatra. Já se esperava – “Robbie Williams Swings Both Ways” dá o nome ao espectáculo – um sujeito clássico, confiante e temperado, com marcas de mestre do entretenimento, tal como o próprio se vende em época de boa cotação no mercado.
Apesar de curta para os fãs (o concerto durou 1h20min), a performance ganhou pontos com o humor britânico e a permanente interacção de Robbie com o público. Admitiu ter comido imensos chocolates antes de subir ao palco, assumiu-me um velho gordo, pediu ao público que gritasse “Robbie, não engordes outra vez!”. E tudo isso resulta lindamente. Umas 23 mil pessoas vibram à sua frente (calcula-se, tendo como referência as quase 60 mil entradas no recinto), mas, mesmo assim, ele consegue fabricar um ambiente caseiro.
Diríamos que o segredo de Robbie Williams é o seu empenho. Ele gosta do que faz como ninguém, sabe provocar e propõe-se, concerto após concerto, aos desafios mais tortuosos, como cantar a “New York, New York” de Sinatra. É claro que para além de homenagear clássicos – os Queen, com “We will rock you”; Lou Reed, com “Walk on the wild side”; ou Ray Charles, com “Hit the road, Jack” –, também sabe presentear o público com canções feitas para o seu timbre: “Come Undone” e “Rock DJ”, por exemplo, fazem-nos lembrar quem ouvimos.
Travadas as músicas a meio e a noite de 25 de Maio seria um consistente medley das grandes canções da vida de Robbie, “rapaz” que esquecemos ter pertencido a uma boys band para considerarmos um “descontraído senhor do palco”.
{gallery}FotoReportagens/2014/RockInRio2014/Dia25Maio/RobbieWilliams{/gallery}
A meia-noite de Ivete
É inevitável falar de Ivete Sangalo sem dizer bem alto: “Tira o pé do chão!” A diva brasileira faz-nos lembrar de onde, afinal, vem o Rock in Rio. Mas, apesar dos 20 anos (de carreira) a mandar tirar o pé do chão, não é só de “Poeira”, axé e samba que Ivete faz a sua parte da noite: “Careless Whisper”, dos Wham! (que já havia cantado no Carnaval de Salvador, este ano) espanta com um suor bem mais interior que o esperado. Talvez não pudesse ser melhor a declaração de amor ao público: “I'm never gonna dance again, the way I danced with you”…
Pode a idade inteira do mundo passar-lhe por cima, como já denuncia o guarda-roupa curto e desafiante, que a energia nunca lhe passa ao lado. Se são 20 anos de carreira, são também dez de Rock in Rio e muita pujança de pernas e braços deste furacão da Bahia. É por isso, certamente, que a multidão esquece de que a segunda-feira de trabalho já entrou em palco. Ivete tem esse poder: reaviva a vontade de dançar num público com uma série de concertos em cima.
{gallery}FotoReportagens/2014/RockInRio2014/Dia25Maio/IveteSangalo{/gallery}